Crise climática: as instituições financeiras como catalisadores da transição energética
Ricardo Guimarães, CEO do BNP Paribas Brasil
Marina Grossi, Presidente do CEBDS – Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável
A crise climática global é uma das maiores ameaças que nossa sociedade vem enfrentando nos últimos anos. Os impactos abrangem todas as esferas da vida humana: ambiental, social e econômica. No aspecto social, comunidades inteiras estão sendo deslocadas devido ao aumento do nível do mar, secas prolongadas e eventos climáticos extremos, como o que observamos no Brasil, no Rio Grande do Sul. Tais episódios e a degradação dos biomas ocasionam a perda alarmante de biodiversidade, a degradação dos ecossistemas e a poluição crescente dos recursos naturais. Já na parte econômica, as consequências são igualmente severas, com prejuízos financeiros resultantes de desastres naturais, perda de produtividade agrícola e a necessidade crescente de investimentos em infraestrutura resiliente.
Neste cenário alarmante, é cada vez mais latente a necessidade de transição para uma economia mais sustentável. E é neste ponto que o setor empresarial e as instituições financeiras têm um papel crucial a desempenhar, como catalisadores de mudanças profundas na nossa sociedade.
É preciso olhar para o mercado e para as carteiras e entender o melhor caminho a seguir. Nesse processo, será imperativo redirecionar fluxos de capital para investimentos sustentáveis, e os bancos e outras entidades financeiras podem catalisar mudanças significativas, promovendo o desenvolvimento de uma economia que seja ao mesmo tempo próspera e responsável.
Cada vez mais, as discussões no mercado financeiro têm envolvido o tema de investimentos em atividades sustentáveis com foco na transição para uma economia de baixo carbono. Soluções com perfil ESG têm o potencial de gerar impactos positivos significativos. Por exemplo, ao financiar projetos de energia renovável, as instituições financeiras podem contribuir de maneira direta para a redução das emissões de gases de efeito estufa.
Investir em tecnologias limpas não só ajuda a mitigar as mudanças climáticas, mas também cria empregos e impulsiona a inovação tecnológica. Além disso, ao apoiar empresas que adotam práticas laborais justas e inclusivas, as instituições financeiras promovem uma sociedade mais equitativa e resiliente.
Esse movimento gradual reflete uma mudança fundamental na maneira como os investidores avaliam o valor das empresas. Em vez de focar apenas em métricas financeiras tradicionais, os investidores estão considerando, também, o impacto das suas escolhas. Contudo, apesar do crescente interesse por investimentos sustentáveis, há inúmeros desafios a serem superados. Um dos principais obstáculos é a falta de padronização nos critérios ESG e na medição de impacto. Sem normas claras e consistentes, fica difícil para os investidores compararem as oportunidades de investimento e avaliar seu verdadeiro impacto. A regulamentação do mercado é um ponto-chave nessa mudança.
Nesse contexto, a taxonomia sustentável – classificação de atividades econômicas de acordo com seus impactos socioambientais, especialmente climáticos, de modo que os fluxos de capital sejam direcionados para aquelas com maior aderência à economia de baixo carbono – ganha relevância para a atração de investimentos.
No Brasil, atualmente esse debate é encabeçado pelo Ministério da Fazenda e envolve ainda o Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep), entre outras organizações. O setor empresarial, representado pelo CEBDS, tem colaborado com esse tema desde 2016, pois ele é estratégico para destravar oportunidades no campo das soluções climáticas atreladas à nossa rica biodiversidade. É preciso gerar regras e padrões adaptados ao cenário do país, de forma alinhada com as taxonomias internacionais para facilitar a intersecção com o mercado internacional.
Já vemos avanços no mercado brasileiro em algumas frentes. Uma delas é a Rede ANBIMA de Sustentabilidade, fórum plural e colaborativo de fomento à agenda ESG no mercado de capitais. Para enfrentar esse desafio, é essencial regulamentar os padrões de avaliação ESG. Iniciativas como a Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD) e os Princípios para o Investimento Responsável (PRI) – das quais o BNP Paribas participa – são passos importantes nessa direção.
Além de ajudar na criação de critérios para investimentos sustentáveis, a regulamentação do mercado também auxilia a tornar as prestações de contas mais transparentes, garantindo que os investimentos realmente cumpram seus objetivos de sustentabilidade.
Outro desafio significativo é o engajamento. Para que os investimentos sustentáveis sejam eficazes, é necessário um esforço conjunto dos stakeholders. Empresas, instituições financeiras, governos e a sociedade civil precisam criar uma linha de diálogo aberto para encabeçar ações colaborativas em prol das práticas de investimento responsáveis.
A concepção e o desenvolvimento de produtos financeiros ESG são responsabilidade das instituições financeiras. Ao criar e promover esses produtos, os agentes financeiros têm em suas mãos a oportunidade de atrair investidores que estão buscando alinhar seus portfólios com seus valores éticos e sustentáveis.
Ao financiar projetos de sustentabilidade – como infraestrutura verde e fontes de energia renovável – e até mesmo a emissão de debêntures, bonds, CRI, CRAs e Fundos -, as instituições financeiras podem acelerar a transição para uma economia de baixo carbono.
Investimentos responsáveis não só proporcionam retornos financeiros sólidos a longo prazo, mas também contribuem para um futuro mais justo e sustentável para todos. Por isso, ao adotar e promover critérios ESG, as instituições financeiras podem alinhar suas operações com os ODS e a Agenda 2030 da ONU, enfrentando os desafios e explorando as oportunidades que surgem nesse novo paradigma.
Além da emergência climática, hoje o mundo enfrenta, simultaneamente, outras duas graves crises que se entrelaçam e para as quais poder público, setor privado e sociedade civil precisam dar respostas: a perda de biodiversidade e a desigualdade social. As finanças e investimentos sustentáveis fazem parte do arsenal de possibilidades para fazer frente a esses desafios, colocando as pessoas no centro da tomada de decisão.
Com esforços coordenados e uma visão de longo prazo, podemos construir uma economia que respeite o planeta e beneficie todas as pessoas, garantindo um legado positivo para as futuras gerações.